segunda-feira, 9 de agosto de 2021

 Matinas

"O sol brilha; junto da caixa de correio, folhas

da bétula cindida, dobradas, plissadas como barbatanas.

Debaixo delas, estames ocos dos narcisos brancos, Triandos,

Trompetes; folhas

negras de violeta selvagem. Noah diz

que quem é depressivo odeia a Primavera, o desequilíbrio

entre o mundo interior e o de fora. Eu tenho

outra ideia - depressiva, sim, mas unida também

à árvore viva, apaixonadamente, o meu corpo

enrolado no seu tronco, à chuva da tarde, quase em paz,

quase capaz de sentir

a seiva borbulhante, subindo por mim. Diz Noah que esse é 

um erro dos depressivos, sentirem um só

com uma árvore. Ao passo que o coração feliz

vagueia pelo jardim como folha caída, um fragmento

da partem não do todo." 

Louise Gluck. A íris Selvagem. Tradução de Ana Luísa Amaral. Editora Relógio D'Água. p. 13

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